quarta-feira, dezembro 28, 2005

Hoje o céu é pesado como a ideia de nunca chegar a um porto...
A chuva miúda é vazia...

Minha alma é uma lâmpada que se apagou e ainda está quente...

Da última janela do castelo só um girassol

Se vê, e o sonhar que há outros põe brumas no nosso sentido...

(Fernando Pessoa, Hora Absurda, 4-7-1913)

1 comentário:

Anónimo disse...

Meus gestos não sou eu,
Como o céu não é nada,
O que passa em mim não é meu
Não passa pela estrada.

O som do vento dorme
No dia sem razão.
O meu tédio é enorme.
Todo eu sou vácuo em vão.

Se ao menos uma vaga
Lembrança viesse
De melhor céu ou plaga
Que esta vida! Mas esse

Pensamento pensado
Como fim de pensar
Dorme no meu agrado
Como uma alga no mar.

E só no dia estranho
Ao que sinto e que sou
Passa quanto eu não tenho,
'Stá tudo onde não estou.

Não sou eu, não conheço,
Não possuo nem passo.
Minha vida adormeço
Não sei em que regaço.

Fernando Pessoa,
poema de 14-10-1913