sábado, dezembro 31, 2005
sexta-feira, dezembro 30, 2005

Canção do ano!
MÃOS ATADAS
Eu tenho as mãos atadas sem ação
quinta-feira, dezembro 29, 2005
quarta-feira, dezembro 28, 2005
terça-feira, dezembro 27, 2005
Rebanhos além monte ela guardava
Seu canto me vem no vento trazido,
E uma ânsia pela sua mágoa

Enche o que em mim é indefinido.
Lagos de espírito murados de rochas
Dormem no vazio da sua toada.
A sua nudez ali se demora
A reflectir na sombra salpicada.
Mas o que há de real em tudo isto
É minha alma, a tarde, o cais somente
E como sombra dos meus sonhos disto,
A dor em mim de nova dor se sente.
Mas o que é ela que traz o pesar?
E o que há nela que o pesar desvanece?
Que rasto de amor é este bem-estar
Que segue o seu trilho, se desaparece?
Lírios há entre corações e mãos.
A vida é pequena ao pé do luar.
Mas movam-se um pouco as árvores que estão
E logo se espera que ela vá voltar.
(Fernando Pessoa, Poemas Ingleses, trad. de Luísa Freire)
Capaz de expressar minha alma inteira.
Vago eu o sinto, como som ou vento,
Mas já talhado em forma derradeira.
Nem estância ou verso ou palavra tem.
Tal como o sonho ele não tem lugar.
Um mero senti-lo, que difuso vem,
Como névoa feliz cercando o pensar.
Neste mistério noite e dia assim
Eu o sonho, o leio e o soletro,
E na berma das palavras sempre em mim
Parece pairar vago e completo.
Sei bem que ele nunca será escrito.
Também sei que não sei o que ele é.
Mas só de sonhá-lo, feliz já fico,
E ventura é ventura, falsa até.
(Fernando Pessoa, Poemas Ingleses, trad. de Luísa Freire)
Tinha de encontrar nas palavras dele tudo o que tenho dito...
Permaneço na berma das palavras. Sonhando-o. às vezes feliz, às vezes não. Com a minha alma inteira. À espera.
sábado, dezembro 24, 2005

Poema do Menino Jesus
Num meio-dia de fim de Primavera
Tive um sonho como uma fotografia.
Vi Jesus Cristo descer à terra.
Veio pela encosta de um monte
Tornado outra vez menino,
A correr e a rolar-se pela erva
E a arrancar flores para as deitar fora
E a rir de modo a ouvir-se de longe.
Tinha fugido do céu.
Era nosso demais para fingir
De segunda pessoa da Trindade.
No céu tudo era falso, tudo em desacordo
Com flores e árvores e pedras.
No céu tinha que estar sempre sério
E de vez em quando de se tornar outra vez homem
E subir para a cruz, e estar sempre a morrer
Com uma coroa toda à roda de espinhos
E os pés espetados por um prego com cabeça,
E até com um trapo à roda da cintura
Como os pretos nas ilustrações.
Nem sequer o deixavam ter pai e mãe
Como as outras crianças.
O seu pai era duas pessoas -
Um velho chamado José, que era carpinteiro,
E que não era pai dele;
E o outro pai era uma pomba estúpida,
A única pomba feia do mundo
Porque nem era do mundo nem era pomba.
E a sua mãe não tinha amado antes de o ter.
Não era mulher: era uma mala
Em que ele tinha vindo do céu.
E queriam que ele, que só nascera da mãe,
E que nunca tivera pai para amar com respeito,
Pregasse a bondade e a justiça!
Um dia que Deus estava a dormir
E o Espírito Santo andava a voar,
Ele foi à caixa dos milagres e roubou três.
Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido.
Com o segundo criou-se eternamente humano e menino.
Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz
E deixou-o pregado na cruz que há no céu
E serve de modelo às outras.
Depois fugiu para o Sol
E desceu no primeiro raio que apanhou.
Hoje vive na minha aldeia comigo.
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas
Que vão em ranchos pelas estradas
Com as bilhas às cabeças
E levanta-lhes as saias.
A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as coisas.
Aponta-me todas as coisas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.
Diz-me muito mal de Deus.
Diz que ele é um velho estúpido e doente,
Sempre a escarrar para o chão
E a dizer indecências.
A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia.
E o Espírito Santo coça-se com o bico
E empoleira-se nas cadeiras e suja-as.
Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica.
Diz-me que Deus não percebe nada
Das coisas que criou - "Se é que ele as criou, do que duvido." -
"Ele diz por exemplo, que os seres cantam a sua glória,
Mas os seres não cantam nada.
Se cantassem seriam cantores.
Os seres existem e mais nada,
E por isso se chamam seres.
" E depois, cansado de dizer mal de Deus,
O Menino Jesus adormece nos meus braços
E eu levo-o ao colo para casa
. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro.
Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava.
Ele é o humano que é natural.
Ele é o divino que sorri e que brinca.
E por isso é que eu sei com toda a certeza
Que ele é o Menino Jesus verdadeiro.
E a criança tão humana que é divina
É esta minha quotidiana vida de poeta,
E é por que ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre.
E que o meu mínimo olhar
Me enche de sensação,
E o mais pequeno som, seja do que for,
Parece falar comigo.
A Criança Nova que habita onde vivo
Dá-me uma mão a mim
E outra a tudo que existe
E assim vamos os três pelo caminho que houver,
Saltando e cantando e rindo
E gozando o nosso segredo comum
Que é saber por toda a parte
Que não há mistério no mundo
E que tudo vale a pena.
A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontado.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.
Damo-nos tão bem um com o outro
Na companhia de tudo
Que nunca pensamos um no outro,
Mas vivemos juntos e dois
Com um acordo íntimo
Como a mão direita e a esquerda.
Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas
No degrau da porta de casa,
Graves como convém a um deus e a um poeta,
E como se cada pedra
Fosse todo o universo
E fosse por isso um grande perigo para ela
Deixá-la cair no chão.
Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens
E ele sorri porque tudo é incrível.
Ri dos reis e dos que não são reis,
E tem pena de ouvir falar das guerras,
E dos comércios, e dos navios
Que ficam fumo no ar dos altos mares.
Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade
Que uma flor tem ao florescer
E que anda com a luz do Sol
A variar os montes e os vales
E a fazer doer aos olhos dos muros caiados.
Depois ele adormece e eu deito-o.
Levo-o ao colo para dentro de casa
E deito-o, despindo-o lentamente
E como seguindo um ritual muito limpo
E todo materno até ele estar nu.
Ele dorme dentro da minha alma
E às vezes acorda de noite
E brinca com os meus sonhos.
Vira uns de pernas para o ar,
Põe uns em cima dos outros
E bate palmas sozinho
Sorrindo para o meu sono
. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Quando eu morrer, filhinho,
Seja eu a criança, o mais pequeno.
Pega-me tu ao colo
E leva-me para dentro da tua casa.
Despe o meu ser cansado e humano
E deita-me na tua cama.
E conta-me histórias, caso eu acorde,
Para eu tornar a adormecer.
E dá-me sonhos teus para eu brincar
Até que nasça qualquer dia
Que tu sabes qual é
. ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Esta é a história do meu Menino Jesus.
Por que razão que se perceba
Não há-de ser ela mais verdadeira
Que tudo quanto os filósofos pensam
E tudo quanto as religiões ensinam ?
Alberto Caeiro, O Guardador de Rebanhos, Poema VIII
sexta-feira, dezembro 23, 2005
quinta-feira, dezembro 22, 2005
Tristeza não tem fim
Felicidade sim
A felicidade é como a gota
De orvalho numa pétala de flor
Brilha tranqüila
Depois de leve oscila
E cai como uma lágrima de amor
A felicidade do pobre parece
A grande ilusão do carnaval
A gente trabalha o ano inteiro
Por um momento de sonho
Pra fazer a fantasia
De rei ou de pirata ou jardineira
Pra tudo se acabar na quarta-feira
Tristeza não tem fim
Felicidade sim
A felicidade é como a pluma
Que o vento vai levando pelo ar
Voa tão leve
Mas tem a vida breve
Precisa que haja vento sem parar
A minha felicidade está sonhando
Nos olhos da minha namorada
É como esta noite, passando, passando
Em busca da madrugada
Falem baixo, por favor
Pra que ela acorde alegre com o dia
Oferecendo beijos de amor
Vinicius de Moraes
in "Poesia completa e prosa: "Cancioneiro"
segunda-feira, dezembro 19, 2005
Amaram o amor urgente
As bocas salgadas pela maresia
As costas lanhadas pela tempestade

Naquela cidade
Distante do mar
Amaram o amor serenado
Das noturnas praias
Levantavam as saias
E se enluaravam de felicidade
Naquela cidade
Que não tem luar
Amavam o amor proibido
Pois hoje é sabido
Todo mundo conta
Que uma andava tonta
Grávida de lua
E outra andava nua
Ávida de mar
E foram ficando marcadas
Ouvindo risadas, sentindo arrepios
Olhando pro rio tão cheio de lua
E que continua
Correndo pro mar
E foram correnteza abaixo
Rolando no leito
Engolindo água
Boiando com as algas
Arrastando folhas
Carregando flores
E a se desmanchar
E foram virando peixes
Virando conchas
Virando seixos
Virando areia
Prateada areia
Com lua cheia
e à beira-mar
(Chico Buarque)
sábado, dezembro 17, 2005
sexta-feira, dezembro 16, 2005
quarta-feira, dezembro 14, 2005
terça-feira, dezembro 13, 2005
Querias metáforas irmãzinha? A minha metáfora de Natal és tu. É estar contigo.
segunda-feira, dezembro 12, 2005

Há algo a mais na Baixa. A cada esquina. No final das ruas. Onde o Tejo já se não vê ela aparece. Intromete-se nas nossas conversas. Claro. Ali está ao fim da rua, a olhar, a olhar, a mostrar-se.
Lisboa tem agora esta presença. Este Natal. À espreita. Sempre à espreita. E a olhar para nós. Como se não existisse. E esta manhã vi-a assim.
sexta-feira, dezembro 09, 2005
quarta-feira, dezembro 07, 2005
Canta, irmão,
Canta meu irmão
Que a liberdade é hino
E o homem a certeza.
Com a dignidade, enterra a
Semente no pó da ilha nua:
No despenhadeiro da Vida
A esperança é do tamanho do Mar
Que nos abraça.
Sentinela de mares e Ventos
Perseverantes.
Entre estelas e o atlântico
Entoa o cântico da liberdade.
Canta, irmão
Canta meu irmão que a liberdade
É hino e o homem a certeza.
terça-feira, dezembro 06, 2005
segunda-feira, dezembro 05, 2005
domingo, dezembro 04, 2005
sábado, dezembro 03, 2005
(Nuno Júdice, Pedro, lembrando Inês, encontrado nos arquivos de http://barcosflores.blogspot.com )
sexta-feira, dezembro 02, 2005
quinta-feira, dezembro 01, 2005

Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.
Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.
És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.
Fernando Pessoa, 1931